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Está-te a apetecer ler a análise de um filme assim, tipo, recente, por parte de alguém (que tem a mania) que percebe do assunto!? Olha, ainda bem porque é mesmo isso que se arranja aqui! Bobinas fresquinhas achincalhadas/elogiadas e avaliadas por quem (diz que) sabe.
"Então e se essa pessoa não tiver ido ver nenhum filme recente, como é que é?" perguntam os nossos caros leitores. Nesse caso (re)bobina-se, que é como quem diz escarafuncha-se afincadamente nos grandes clássicos...ou nos "flops" de bilheteira monumentais!
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Tenha Medo...Tenha muito medo...de fazer a barba!
Sweeney Todd, o Terrível Barbeiro de Fleet Street
por Dinis Lourenço

Quando fui ver a peça do Sweeney Todd, no Teatro Aberto, pouco antes de estrear o filme, eu disse para com os meus botões "o Tim Burton consegue fazer algo magnífico daqui" (e estamos a falar de um Tim Burton que me tinha andado a desiludir com o "mauzinho" "Charlie e a Fábrica de Chocolates" e um "muito bom mas com um sabor esquisito" "Noiva Cadáver"). E, de facto, conseguiu. Os únicos erros que lhe consigo apontar são comparando com a peça...mas já lá vamos!

Este musical da Broadway, escrito por Hugh Wheeler e musicado por Stephen Sondheim, conta a história (um pouco invulgar para um musical da Broadway) de Benjamin Barker (interpretado por Johnny Depp), um simples barbeiro, que vive feliz com a sua mulher mas que vê a sua vida dar uma gigantesca reviravolta quando é mandado para o exílio, injustamente, pelo juiz Turpin (Alan Rickman), que lhe cobiça a mulher. Anos mais tarde Benjamin Barker regressa, envergando o nome Sweeney Todd e, com ele, uma dantesca sede de vingança...a melhor vingança desde Kill Bill.
A história tem todos os elementos de um filme de Tim Burton: um ambiente sinistro e gótico, humor negro, alguma crítica social (pois a vingança de Sweeney é dirigida a toda a sociedade industrial e corrupta da Londres do século XIX), uma história de amor distorcida entre Sweeney e a padeira Mrs. Lovett (Helena Bonham Carter), que o acolhe em sua casa.
De facto, esta "história de amor" é uma das coisas mais perturbadoras no filme, apesar de estar mais patente na peça do Teatro Aberto (possivelmente devido ao superior desempenho de Ana Ester Neves a interpretar Mrs. Lovett). É que Mrs. Lovett ama Sweeney Todd. De um modo doentio. Do mesmo modo doentio com que Sweeney ama a sua mulher que morreu (o seu passado, a sua vingança, as suas navalhas). É um estranho, perturbador mas algo comovente triângulo amoroso.
Isto remete-me para os actores, dos quais quem mais se destaca é Johnny Depp, que conseguiu adaptar-se perfeitamente à personagem (mas como, aliás, já o tinhamos visto fazer antes nos

Piratas das Caraíbas). Mas ele não é o único que está como deve ser neste filme! Alan Rickman (o “professor Snape”, com a sua maravilhosa voz) mostra-se um Juiz Turpin deveras sombrio e Helena Bonham Carter oferece-nos uma Mrs. Lovett bastante perturbada (apesar de continuar a preferir a Ana Ester Neves). E claro, Sacha Baron Cohen prova às más línguas que é realmente um bom actor, descolando-se de Borat, Bruno e Ali G e interpretando brilhantemente Adolfo Pirelli, o barbeiro rival de Sweeney Todd.
E a música!? É com a música que os actores que eu referi em cima mostram que são de facto bons e que foram muito bem preparados, visto que nenhum deles é cantor e, durante todo o filme, não tentam sê-lo. Cantam, sim senhor, mas não se põem com aventuras de quem pensa que sabe cantar. É algo sóbrio. A única coisa que lamento, mas que também só faz sentido na peça, é a ausência do coro, que dava uma dimensão muito mais sombria à história.

Esteticamente o filme é lindíssimo. Às vezes parece a preto e branco, pois as cores são-nos apresentadas gastas, velhas, sujas. Todas as cores menos uma: o vermelho do Sangue. Pela primeira vez em Tim Burton, o sangue toma um papel muito principal em todo o filme. Ele é totalmente surreal, pegajoso, espesso, um tom de vermelho quase cor-de-rosa, vivo e que causa um espectacular contraste com o resto do cenário morto como eu só vi em Sin City.
Resta-me dizer que é uma excelente adaptação de um musical fora do vulgar, falhando em apenas algumas coisas, como a personagem da mendiga, que podia estar melhor aproveitada. Mas nem por isso o filme fica atrás da produção teatral, pois utiliza inteligentemente o trunfo da fotografia, criando imagens como a que fecha o filme (e deixem que vos diga que tem um final surpreendente...mas justo)...um verdadeiro "La Pietà".
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